quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Crônicas das pedaladas 4



Em 2003, quando retornei de Brasília para São Luís, fomos morar no condomínio Barra Mar, no bairro do Calhau. Ali alugamos uma cobertura e nos instalamos. Naquela época, tínhamos quatro crianças em casa e precisávamos de alguém que nos ajudasse nas tarefas domésticas. A Sílvia anunciou no condomínio a nossa necessidade e alguém nos recomendou a Maria, uma empregada doméstica que já havia trabalhado em um condomínio próximo e era uma pessoa de confiança.
Maria era, de fato, uma pessoa de confiança, trabalhadora, cumpridora dos seus deveres. Por isso a Sílvia e todos na casa gostavam muito dela. Era uma interiorana de Miranda do Norte que emigrou para a periferia de São Luís. Vivia em um daqueles bairros violentos, entre os bairros Olho D´Água e Araçagi. Morava de aluguel em um quartinho. Um cubículo multifuncional, cujo uso ia de lavanderia a dormitório. Mas chamava a nossa atenção pelo seu bom humor, pontualidade, destreza, tempestividade, habilidade culinária e senso de arrumação de tudo que havia na casa. Pessoa nova, uns 30 anos ou menos naquela época, gostava de se divertir, tomar uma cerveja no fim de semana, mas deixava-nos muito tristes quando chegava à nossa casa com o rosto cheio de hematomas. Coitada! Mesmo cheia de dores, trabalhava de bom humor, embora em algumas ocasiões pedisse para sair mais cedo, ou a Sílvia, quando via o seu estado, pedia de imediato que ela procurasse médico e depois fosse repousar. Uma realidade triste, que graças a Deus, hoje é combatida com veemência, graças a Lei Maria da Penha.
Um dia Maria chegou atrasada e foi logo justificando que daquele dia em diante seria sempre assim, a bicicleta que ela usava para chegar ao serviço estava toda desmontada e, de tão velha o conserto seria caro demais para ela pagar. Daquele dia em diante trabalharia com o objetivo de juntar uns trocados para comprar outra bicicleta. Para não dar “de mão beijada”, como falava a minha mãe, uma bicicleta nova para a Maria, pedi que ela me vendesse a bicicleta dela do jeito que estava, que eu lhe daria dinheiro suficiente para comprar outra. Assim foi feito, um dia Maria chegou com um saco de estopa cheio de peças de bicicleta e eu a paguei, de forma que de imediato ela comprou outra bicicleta.
Procurei um mecânico de bicicleta lá no bairro do Vinhais, nas imediações do Cemitério, e o solicitei um reparo total daquele monte de peças, pintura do quadro, de modo que a bicicleta parecesse nova. O cara fez tudo conforme eu pedi, mas nem usei muito a bicicleta em São Luís. Em junho de 2004 fui chamado a assumir o cargo de agrônomo no Banco da Amazônia, no Estado do Tocantins, na cidade de Tocantinópolis. Ali eu a usei mais. De vez em quando eu pedalava ao lado do meu filho mais novo, outras vezes eu pedalava sozinho, mas esporadicamente. A verdade é que durante esses doze anos que possuo essa bicicleta, ela ficou muito tempo sem uso.
Em 2010 vim transferido para Santa Inês e a usei uma ou duas vezes e a coloquei de volta na despensa. E, somente, em meados deste 2015, após a minha desilusão e até angústia decorrente da minha experiência em academias resolvi tirá-la do “estaleiro” e, concomitantemente, comecei a ler sobre o ciclismo de estrada, especificamente. Como escolher a bicicleta apropriada para o seu tamanho? Qual a bicicleta específica para as diversas modalidades de ciclismo? Quais são as peças de uma bicicleta? Cuidados que devem ser tomados quando o ciclista vai pegar a estrada. Quais as possibilidades e diferenças entre bicicletas aro 26, aro 29 e as novas aro 27,5. Fabricantes de peças, especificidades do ciclismo de estrada.
Tive também a oportunidade de conversar com o ciclista Marinho, vizinho dos meus sogros, Luis e Moema Aranha, no condomínio Barra Mar,  também praticante do ciclismo de estrada, que o meu querido amigo/irmão Átila Roque chama de ciclismo da selva urbana, pois ele pratica em São Luís naquele trânsito maluco, entre carros e motos. Em meia hora de papo, o Marinho me ensinou muita coisa e me indicou sites especializados no assunto. Valeu, Marinho!
A partir dessa conversa e das leituras que tenho feito em páginas especializadas eu dei uma pequena incrementada na minha magricela. Pintei-a novamente, troquei o cassete de sete, por um de oito marchas; mudei os cubos, coloquei cubos com rolamentos que deixam a bicicleta mais leve. Troquei os passadores e os manetes dos freios, que eram velhos, por um conjunto da marca Shimano. Troquei o selim que era duríssimo, por um selim mais macio, coloquei nos pneus fitas anti-furos. Passei a usar bermuda de ciclista, que ameniza o impacto do glúteo no selim, passei a usar luvas, pois o Marinho disse-me que este é um equipamento muito importante em casos de quedas. Comprei também os faróis de sinalização dianteiro e traseiro, além de um ciclo computador. Troquei as rodas por um tipo mais leve e mais atual, com raios mais finos.
A minha bicicleta não é do tipo speed, muito menos do tipo montain bike, é uma bicicleta comum dessas que os trabalhadores do Pindaré usam para chegar ao trabalho. Eu apenas fiz essas adaptações, tomando o cuidado para não descaracterizá-la.
Quando eu comecei a pedalar com ela no seu estado “original”, a velocidade máxima que eu alcançava era de 33 Km/h; hoje, de acordo com o ciclo computador, eu já alcancei a velocidade de 47,8 Km/h, justamente, nesta última viagem que eu fiz até o município de Igarapé do Meio. Confesso que quando vi o velocímetro mostrando que eu estava ultrapassando a marca dos 40, eu fiquei muito feliz, muito entusiasmado, muito emocionado. Creio que isto me ajudou a superar as minhas limitações físicas. Claro que eu adito a esta aquele cumprimento do motoqueiro que me deu o título de cidadão do Pindaré.
Nem preciso falar da minha satisfação, todos percebem que a minha magricela é o brinquedinho que eu descobri aos 58 anos de vida. Prometo que na próxima vou falar para vocês sobre o meu conceito da palavra brinquedinho.
Tenho a pretensão de deixá-la, pelo menos, dois quilos mais leve. Pretendo alcançar esse objetivo com a substituição de algumas peças por outras feitas com materiais de menor densidade. Apesar de pretender ter uma bicicleta mais moderna, no futuro, a médio prazo; no momento estou curtindo a minha magricela tradicional. Paixão mesmo!


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quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Crônicas das pedaladas 3



Creio que todo mundo que pratica um esporte tem alguma causa que lhe levou a isso. A necessidade de correção da postura, ajuda na cura de uma doença, como meio de canalizar energia de forma positiva para uma atividade, ou habilidade, apenas para sair do sedentarismo e tantas outras causas.
Durante a infância e a adolescência eu pratiquei alguns esportes e gostava muito de todos eles: futebol, futebol de salão, basquete, caratê, tênis de mesa. Aprendi a nadar no Rio Itapecuru, do qual morava à margem. Como todo dia banhávamos naquele rio e todos os meus colegas nadavam, experimentei as primeiras braçadas de forma muito original. Não lembro o que fiz de errado, mas a minha mãe nunca deixava barato quando eu brigava na rua, chamava palavrão perto de alguma pessoa mais velha, ou deixava de cumprir uma ordem dela. Lembro-me que estava banhando na beira do rio e ela chegou furiosa mandando que eu subisse a rampa porque naquele momento eu ia apanhar uma surra. Entrei em desespero e me aventurei nas primeiras braçadas para o meio do rio. Quando ela percebeu o perigo que eu corria nadando daquele jeito, no velho Itapecuru, ela entrou em desespero e começou a pedir que eu voltasse. Voltei e não apanhei naquele dia, quando percebi que sabia nadar. Gosto de nadar, acho a natação um esporte maravilhoso e passei a admirá-la mais quando os meus dois primeiros filhos praticavam esse esporte num nível quase profissional.
O ciclismo nunca esteve na minha vida como uma possibilidade de prática esportiva. Na Rosário da minha infância, era comum as famílias possuírem uma ou mais bicicletas em casa. As marcas Monark e Caloi dominavam o mercado. A minha casa era muito frequentada, as pessoas chegavam e estacionavam a bicicleta na calçada e, enquanto elas conversavam com a minha mãe, eu pegava as bicicletas e me aventurava a pedalar nas ruas de areia ou piçarra daquela época. Assim foi que eu aprendi a me equilibrar sobre uma bicicleta.
Minha paixão pelo futebol nunca diminuiu, ainda gosto de jogar bola, mas na minha condição física e com o sobrepeso que tenho, além de não render nada, me exponho facilmente a lesões musculares quando jogo bola.
Exercitar-se em uma academia passou a ser uma alternativa para pessoas que pretendiam melhorar a forma física para praticar algum esporte, ou mesmo para sentir-se de bem consigo mesmo. Entretanto, depois que inventaram o tal de personal trainer algumas academias deixaram de dar a devida atenção para os seus “alunos”, passando a tratá-los como meros locatários de aparelhos para a prática de exercícios físicos. Horrível!
Tentei a hidroginástica numa academia excelente que existe aqui em Santa Inês, mas aí o problema foi meu. Não me adaptei a esse tipo de exercício físico. Gosto de nadar, porém não posso dizer o mesmo da hidroginástica.
Para a caminhada que eu gosto também, me ressinto da falta de lugares apropriados para essa prática de exercício físico aqui. Foi pela desilusão com as academias e a necessidade intrínseca que sinto de me exercitar que acabei recorrendo a uma bicicleta que eu comprei de segunda mão há mais de 12 anos. Estava encostada na despensa, com os pneus secos, muita ferrugem, necessitando de uma boa manutenção. Foi a esse objeto que eu recorri e deu no que deu. Na próxima eu vou falar apenas desse objeto, que agora eu chamo carinhosamente de minha magricela.

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terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Crônicas das pedaladas 2



O ciclismo nos ensina muitas coisas. Primeiro, pedalar na estrada é coisa séria e exige planejamento. Ninguém deve pegar a estrada só por que comprou uma bicicleta speed ou montain bike, por exemplo. Da mesma forma, não é necessariamente preciso praticar ciclismo com bicicletas caras.
Ainda sou um ciclista incipiente, mas a prática me ensinou que para praticar o ciclismo precisamos tomar alguns cuidados.
Segundo, antes de ir para a estrada, é necessário conhecer as suas limitações como um iniciante e procurar ler, se informar sobre a modalidade que você deseja praticar. A internet tem muitas informações e ter consciência do está fazendo é muito importante. Vou dar um exemplo, do que aconteceu comigo. Antes de começar a pedalar, eu andava na estrada de Pindaré (na verdade, estrada Santa Inês/Pindaré) e já estava caminhando 16 Km, ou seja, ida e volta, Santa Inês/Pindaré/Santa Inês. Quando resolvi pedalar, peguei a bicicleta e me mandei para Pindaré, quando cheguei perto da metade da viagem já estava morto de cansado, não tinha condicionamento físico para pedalar essa distância.
É necessário criar condicionamento físico e a bicicleta ajuda muito nisso. Basta percorrer pequenas distâncias e ir aumentando o percurso progressivamente, sem ânsia, sem pressa e, quando percebemos já estamos no nível que pretendíamos. Creio que um ciclo computador pode ajudar muito, pois este possibilita vermos a distância percorrida e o tempo gasto, a velocidade máxima, a velocidade média, a quantidade de calorias gasta, entre outras informações.
Terceiro, todo cuidado é pouco, aqui no interior do Maranhão não temos ciclovias e, se não estivermos em grupo, somos obrigados a usar o acostamento como ciclovia e, de modo geral, os acostamentos não têm a condição adequada para o desempenho do ciclismo de estrada. Algumas estradas não têm qualquer acostamento. O ciclista sai do asfalto e cai na areia solta, num acostamento cheio de buracos, ou mesmo no cascalho solto, dependendo da velocidade e da habilidade do ciclista, essa mudança pode acarretar quedas e sérios danos à bicicleta e aos equipamentos.
Pedalar nos permite um aprendizado constante e progressivo. A interação ciclista/bicicleta é fantástica. A cada dia que você pedala, vai percebendo melhor o equipamento que você tem e vai aproveitando melhor os recursos que ele te disponibiliza, assim como as suas limitações. Isso permite ao ciclista interagir da forma mais adequada com o ambiente – aclive, declive e a superfície plana, lhe permite aproveitar melhor da sua energia, menor desgaste físico, entre outras vantagens. É prescindível avisar da necessidade do conhecimento da legislação brasileira do trânsito, à medida que o ciclista tem obrigações semelhantes ao condutor de veículos automotores. Uma vez cônscio das suas obrigações, direitos e das condições logísticas disponíveis, resta-nos desejá-los sucesso.
 

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sábado, 19 de dezembro de 2015

Crônicas das pedaladas 1



Outro dia, lá na Rehabiliter Aqua Fitness, escola de natação da minha filha Joana, a professora Fabiana disse que me viu pedalando de luvas, capacete, outros equipamentos específicos do ciclismo e me perguntou como eu me sinto enquanto pedalo pelas estradas. Gostei do assunto e resolvi escrever sobre isso.
Há tempos pedalo fazendo crônicas sobre o que vejo e sinto nas estradas, mas não tenho passado as coisas que penso enquanto pedalo para o papel. Gosto da brisa quase fria de Pindaré Mirim, acho a estrada naturalmente bonita em alguns trechos e aprecio os últimos quinhentos metros antes de chegar à praça da rampa, onde fica o bar e restaurante flutuante. Não me canso de ver a linda chaminé do velho Engenho Central. Quando eu o avisto sinto uma inexplicável felicidade: a chaminé imponente, a arquitetura inglesa, uma parte viva da nossa História resistindo ao descaso político dos administradores daquele município.
Às vezes eu fico pensando: - em que lugar do mundo se deixaria uma parte tão importante da história de um povo se deteriorar no tempo de tal forma? O trato dado ao nosso velho Engenho Central é ruim tanto para a nossa memória histórica como para o município de Pindaré Mirim, que se o transformasse em museu estaria arrecadando algum recurso e, simultaneamente, atraindo muitos turistas para o município, o que poderia melhorar o desempenho comercial daquela cidade.
Voltando à estrada, gosto de cumprimentar as pessoas que caminham enquanto eu pedalo. Passo distribuindo bom dia para todas que encontro. Às pessoas que vão trabalhar de bicicleta o cumprimento é diferente – oi. Eles respondem oi também, mas de uma forma muito característica da região. Eu gosto disso. Uns até já falam comigo com certa intimidade, outros sorriem simpaticamente, mas o que eu não sabia era que algumas pessoas me identificam como um morador de Pindaré. Que legal!
Hoje, 19.12.2015, quando eu pedalava rumo ao município de Igarapé do Meio, um motoqueiro passou por mim, carregando uma pirâmide de bancos de madeira, acredito que levava mais de dez bancos, aos gritos ele dizia te conheço, te conheço, você é lá do Pindaré, falei que sim e o cumprimentei alegremente. Achei legal. Agora sou cidadão do Pindaré, título ganho na estrada – BR-316 nas imediações do lugar conhecido como Estaca Zero. Fiquei feliz, acredito que o título ajudou a fazer uma viagem feliz, fui e voltei com muito gás, pedalei 62,91 Km, fiz algumas paradas estratégicas para reidratação, fotografar a cidade e comer algumas barras de cereais. Gostei do resultado!

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