Eram esses os nomes que nós o
chamávamos. Confesso, não sei o seu verdadeiro e completo nome, apesar da
intimidade que tínhamos.
Creio que já estávamos na segunda
metade da década de 1970, quando no bairro do Codozinho correu a notícia: -
Lourinho voltou. – Qual Lourinho? O tio do Bodinho. Irmão da Tereza do Osvaldo
bananeiro. E por aí ia... Voltara do Rio de Janeiro. Era uma avalanche de
informações nas quais os apelidos se sobressaiam e, só quem era do meio
compreendia.
Bem, logo fomos ter com o
Lourinho lá no Beco do seu Viégas, onde nos reuníamos nos finais de tarde,
início de noite. Ali “trocamos umas figurinhas” e ficamos próximos, depois veio
o jogo de bola na Areinha e nos aproximamos mais. Descobri que o Louro era
torcedor do Fluminense, como eu e o Sérgio Gordo. No Codozinho, a maioria
torcia pelo Flamengo.
Mais adiante, ficamos parceiros
no futebol. Louro conquistou posição na zaga do Clube do Remo, o nosso time do
bairro, no qual eu era lateral esquerdo. Então, ali eu o chamava de Silveira,
zagueiro, da época, do Fluminense. Ele me chamava de Marco Antônio, lateral esquerdo,
do Flu.
Depois nos descobrimos como
afeiçoados do jogo de dama. No bairro do Codozinho, só ele e o Dudu,que eu
também o chamo de Meu Santo, eram páreos para mim nessa modalidade.
Agora, já éramos amigos, íntimos,
jogadores de dama para os quais a atenção dos amigos se voltava quando
estávamos na disputa.
O jogo de dama, tal como o
xadrez, exige o máximo de concentração dos jogadores, mas naquele, quando
jogamos, fazemos algumas artimanhas para desconcentrar o adversário. O Louro,
quando fazia uma jogada em que dava uma pedra e comia três ou quatro pedras
minhas ou do Dudu, costumava dizer assim: -“come aqui Meu Santo” e, então,
procedia aquela jogada arrasadora que o levava a ganhar, ou, no mínimo, empatar
o jogo. Mas, nem eu nem o Dudu, deixávamos barato, sempre devolvíamos com a
mesma moeda e, por isso, passamos a nos chamar de “Meu Santo”.
Um dia, quando jogávamos, o Zé Maria
do Serrote, meninote ainda, hoje, grande criminalista, chegou perto e viu que
eu ganhava com vantagem do Louro e começou a me chamar de Rei Lulu, uma
paródia, ao lutador maranhense de luta livre, o Rei Zulu. Não perdi a deixa e, para irritar mais o Lourinho,
fiz de pronto uma cantiga, assim: - “Ele é jogador de dama/ganhando de Norte a
Sul/E o nome dele/É Rei Lulu/E o nome dele é Rei Lulu”. Aí eu perguntava o nome
dele e plateia respondia – “É Rei Lulu”.
Isso, às vezes funcionava, outras
vezes, ele, o Louro, virava o jogo e começava a perguntar: - “Como é o nome
dele?” e, eu perdendo, ou sendo vítima de uma jogada sensacional, ficava
calado, é claro, e ele voltava à carga: - “Perdeu a fala, Meu Santo?”. E, assim
corria o jogo inteiro. Sempre um tentando desconcentrar, irritar, distrair, o
outro.
Louro era uma pessoa que se
sobressaia aos demais. Frequentava a turma da “esquadrilha da fumaça” do
Codozinho de Baixo, mas sempre foi querido no Codozinho de Cima. Tanto era
assim, que era titular no nosso time de”pelada” (jogo de futebol sem chuteiras).
Solteiro, nunca o vi com uma namorada. Dava as suas saídas, mas nunca se
comprometeu com ninguém. Desde que o conheci, trabalhava como guarda de
segurança e nessa profissão se aposentou.
Era cônscio da vida que queria
pra si, e assim viveu a vida toda, até que o Grande Deus o chamou, no mês
passado, para fazer parte do plano celestial. Foi vítima de infarto fulminante.
Há muito tempo não jogo dama,
entretanto, fica em nosso coração uma enorme lacuna deixada pela ausência, pela
passagem desse parceiro para outro plano. Lourinho, agora a tua vida faz parte
da rotina celestial e Deus te iluminará para todo o sempre. Eu e o Dudu
perdemos um grande e virtuoso parceiro, que de agora em diante não será mais
apenas Meu Santo – como eu e Dudu chamávamos, mas, será santo do Senhor.
Que a tua passagem seja, enfim, como sempre foi
a tua vida aqui, entre nós – calma, serena, prazerosa, tranquila. Obrigado por comentar.
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